terça-feira, 9 de novembro de 2010

Estudantes Digitais, Educadores Analógicos


30 Setembro, 2008
O bom ensino supera uma escolha tecnológica pobre, mas a tecnologia nunca salvará o mau ensino”. Por outras palavras, Tony Bates defende que o desafio da Educação não é tecnológico. Na verdade, apesar da tecnologia ser importante pois faz parte integrante da vida dos estudantes de hoje, os nativos digitais, é uma ilusão pensar-se que a tecnologia é a chave da modernização da educação.
Nesta matéria, o emblemático Plano Tecnológico da Educação, enuncia “uma viragem decisiva de encontro ao que realmente importa na Escola: ensinar e aprender”. A ambição, até 2010, é “colocar Portugal entre os cinco países europeus mais avançados em matéria de modernização tecnológica das escolas”.
Para atingir esse objectivo estratégico, o Plano define três metas. Duas metas relativas à tecnologia (banda larga e computadores) e uma aos professores (competências). Das 12 medidas que integram o Plano somente duas incluem os estudantes nos destinatários, os Estágios e as Academias TIC. Em síntese, parece que a modernização das escolas se fará com a tecnologia, distribuindo centenas de milhares de computadores a estudantes, professores e escolas e aumentando a largura de banda no acesso à internet.
Mas, será que acrescentar novas tecnologias aos tradicionais processos de ensino-aprendizagem é o caminho certo? Segundo Marc Prensky, antes de introduzir tecnologia é fundamental “ouvir os nativos digitais”, ou seja, conhecer os seus estilos de aprendizagem de modo a definir novos processos de ensino-aprendizagem adequados à geração digital que vive na “idade da velocidade”.
Basta ler “Twitch Speed” onde Marc Prensky descreve as 10 características dos nativos digitais, e “Closing the Digital Divide” onde Ian Jukes descreve os estilos de aprendizagem dos estudantes digitais e estabelece uma comparação com os estilos de ensino dos professores e educadores tradicionais, para ficar claro que os estudantes mudaram e que o desafio central da educação não é a tecnologia mas sim as pessoas.
Nessa comparação, Jukes identifica oito diferenças principais. A primeira é que os estudantes digitais preferem receber rapidamente informação de múltiplas fontes, enquanto muitos educadores preferem a transmissão da informação de forma lenta e controlada, com recurso a fontes limitadas como as aulas e os manuais escolares. De facto, a geração dos jogos e da internet está habituada a aceder rapidamente à informação que lhes interessa sem restrições de maior.
A segunda diferença é que os estudantes preferem realizar múltiplas tarefas, como estar a fazer os trabalhos de casa no computador, ao mesmo tempo que ouvem música, pesquisam na internet, gravam um CD e enviam mensagens (atenção parcial contínua), enquanto muitos educadores preferem realizar uma tarefa de cada vez.
Outra diferença, a terceira, é que os estudantes preferem aprender através de vídeos, imagens e sons em vez de texto enquanto muitos professores preferem ensinar recorrendo ao manual escolar em texto em detrimento do vídeo e da imagem. Contudo, o sucesso do Youtube e do Flickr espelha bem as preferências dos jovens. A quarta diferença é que os estudantes preferem aceder à informação de forma aleatória, explorando os hiperlinks de modo livre e caótico, enquanto muitos educadores preferem seguir o programa da disciplina e transmitir a informação de forma lógica e sequencial, ou seja, passo-a-passo.
A quinta diferença é que os estudantes preferem estar conectados a muitas pessoas, em simultâneo, como acontece no HI5 e MySpace, enquanto muitos educadores preferem que os estudantes trabalhem sozinhos antes de os deixarem conectar-se e interagir. A sexta diferença é que os estudantes preferem aprender “just-in-time” como acontece quando recebem um telemóvel novo e descobrem as suas funcionalidades sem consultar o manual, enquanto os educadores preferem ensinar “just-in-case”.
A sétima diferença é que os estudantes preferem ser gratificados instantaneamente e receber prémios imediatos como acontece nos jogos electrónicos com o acesso imediato ao nível seguinte e a distinção na lista dos melhores jogadores. Pelo contrário, muitos educadores preferem adiar as gratificações e os prémios para o final do período ou do ano lectivo.
Por último, a oitava diferença é que os estudantes estão orientados para o jogo, preferindo aprender o que é relevante, imediatamente útil e divertido, enquanto muitos educadores estão orientados para o trabalho limitando-se a cumprir o programa e a fazer os testes de avaliação.
É evidente que, em Portugal, estas diferenças não são tão nítidas como no Canada de Prensky e na Austrália de Jukes, mas também é evidente que a geração dos jogos e da internet é já uma realidade no nosso país e que a educação tem de se adaptar aos estudantes digitais.
Neste contexto, em que a aprendizagem monocromática das Escolas Analógicas dá lugar à aprendizagem policromática dos estudantes digitais, será que a tecnologia é suficiente para, segundo o Plano Tecnológico da Educação, “tornar a Escola num espaço de interactividade e de partilha de conhecimento sem barreiras (…) e preparar as nossas crianças e jovens para a sociedade do conhecimento”?